quinta-feira, 29 de março de 2012

Precisamos ser ONG?

"Você representa qual ONG?" À pergunta, feita algumas vezes quando divulgo a iniciativa de arrecadar tênis para meninos e meninas atletas que competem descalços, respondo sempre: "Não represento nenhuma ONG, nenhuma instituição". É uma iniciativa pessoal, tomada por uma pessoa que se entristece com a desigualdade e que procura, de algum modo, contribuir para minimizá-la, com os instrumentos disponíveis - a palavra, os contatos, as relações, pessoas solidárias.

Será que precisamos vestir a camisa de uma ONG, para demonstrar que nos indignamos com a ausência de proteção, com a injustiça social, ou para que nossa voz seja ouvida? Acredito na soma das ações individuais bem direcionadas, no olhar que se volta para o outro, na solidariedade sem CNPJ, movida pela boa vontade, pelo desejo de melhorar.

Esta é uma iniciativa individual, que conta com adesões individuais. Somados, esses esforços contribuirão para que um pequeno número de crianças chegue à quadra calçada na próxima competição. Não vai mudar a realidade da infância alagoana, tenho consciência. Mas vai minimizar uma situação específica, localizada, contribuindo para melhorar o desempenho de meninos e meninas que gostam de esporte e que passarão a jogar e a correr de modo mais adequado. Para esses meninos, nosso pequeno gesto fará diferença, não tenho dúvida disso.

Acompanho diariamente o noticiário local e nacional e a mídia, em geral, com especial atenção ao que se refere aos direitos da infância. A violência, a negligência e a exploração, todas faces dos maus-tratos a que está exposta parte significativa dos meninos e meninas são os principais fatores de transgressão das leis de proteção e os principais alimentadores de notícias com as tags "criança" e "adolescente".

Nesse aspecto, esta semana, a mídia local noticiou fatos como o resgate do corpo de um menino de 10 anos que foi encontrado mutilado, dentro de um saco, no município de Teotônio Vilela [http://gazetaweb.globo.com/noticia.php?c=267032]. O programa Pajuçara Manhã da última segunda-feira (26) foi pontuado pela enquete: "Você é contra ou a favor da Lei da Palmada?", em que a maioria dos telespectadores que se posicionaram reportaram ser contrários à lei, a maioria por considerar que cabe aos pais - e só a eles - a decisão sobre a melhor maneira de educar seus filhos. Muitos informaram ter sido vítimas de "palmadinhas", na infância, sem que isso lhes tenha causado prejuízos. A lei é controversa e segue em tramitação no Congresso. Sou a favor da aprovação, em sua totalidade, por acreditar que a palmada é um mecanismo violento, desigual, deseducativo e que está nas bases da violência doméstica. 

Ontem, o Brasil inteiro ficou chocado com a notícia de que, em Aparecida de Goiânia, um menino de 1 ano morreu asfixiado, por ter sido esquecido, durante horas, dentro de um carro fechado. O menino morreu dentro da garagem de casa e a mãe foi acusada por vizinhos de ter cometido outras agressões contra a criança - há testemunhas de tentativa de afogamento [http://g1.globo.com/goias/noticia/2012/03/mae-ja-tentou-afogar-bebe-que-morreu-em-carro-dizem-testemunhas-policia.html] . Será indiciada por homicídio doloso, porque, para o Ministério Público, houve a intenção de matar.

Na nova novela das 21h da TV Globo, uma menininha se destaca entre dezenas de outras crianças exploradas como catadores em um lixão, onde trabalham em troca de comida e sofrem violência física quando não atingem determinada meta. A personagem, vítima de maus-tratos domésticos e abandonada no lixão após a morte do pai, choca os telespectadores do horário nobre com o drama histórico da exploração do trabalho infantil. O mesmo drama observado diariamente nas ruas de Maceió, nos semáforos onde meninos lavam para-brisas e fazem malabarismos em troca de uns trocados que vão parar nas mãos de gente violenta e sem princípios. 

Precisamos assistir à novela, para nos indignar com o drama real do trabalho infantil? Precisamos ser ONG, para ver o desconforto das vidas que passam ao lado da gente? Precisamos ser ONG para denunciar o vizinho que maltrata seus filhos [Disque 100]? Precisamos ser ONG para denunciar a exploração, a violência e a negligência doméstica? Precisamos ser ONG, para doar um par de tênis usado para crianças que jogam descalças? Não precisamos ser ONG para garantir às crianças do nosso entorno o direito de decidir quando correr descalça.

Com todo o respeito que tenho pelo trabalho de muitas ONGs sérias e respeitáveis, algumas das quais com links nesse blog, na seção Vale Visita, considero que a  iniciativa individual não precisa de logomarca para validação.

Para se posicionar, acesse: http://www.ocurumin.blogspot.com.br/2012/03/crianca-descalca-nos-incomoda-para-onde.html . Ou ligue: (82) 8805-0484 / 9104-7735.

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